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Café com Pesquisa – Entrevista com o prof. Denilson Junio Marques Soares
Nesta edição do "Café com Pesquisa - Entrevistas" vamos conhecer a trajetória do professor Denilson Junio Marques Soares. O docente é pesquisador de Pós-Doutorado na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com área de concentração em Demografia da Educação. É também Doutor em Educação pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), com atuação na linha de pesquisa “Educação, Formação Humana e Políticas Públicas” e realização de estágios de doutoramento na Universidad de Santiago de Chile (Usach/Chile) e na Universitat de València (UV/Espanha). O docente é, ainda, Mestre em Estatística Aplicada e Biometria e Licenciado em Matemática pela Universidade Federal de Viçosa (UFV), com período sanduíche pela Technische Universität München (TUM/Alemanha).
"Deixe que a pesquisa faça sentido primeiro para você. Quando ela dialoga com a sua história, com o seu território e com o que você acredita, o caminho se torna mais leve, mais bonito e, sobretudo, mais transformador." -- Denilson Marques
Ingressou no IFMG em 2017, com passagem pelo Campus Piumhi (2017-2023) e, atualmente, é professor de Matemática no Campus Ouro Preto. Denilson também integra o corpo docente colaborador do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na linha de Educação Matemática. Foi professor da rede estadual de Minas Gerais e do Colégio de Aplicação (CAp-Coluni) da UFV.
\lidera o Grupo de Pesquisa Análise e Modelagem de Dados Educacionais (GrAMDE), certificado pelo CNPq, é membro da Comissão de Análise de Dados de Testes e Questionários da Educação Básica em Larga Escala do Inep/MEC e é editor na área de Educação da Revista Científica ForScience.
Uma boa conversa combina com café. Pegue sua xícara e conheça a trajetória de Denilson Marques na pesquisa!
Em que momento a pesquisa passou a fazer parte da sua vida acadêmica e profissional?
Apesar de ter iniciado cedo, com três iniciações científicas na graduação, um intercâmbio pelo Ciência sem Fronteiras na Alemanha e o Mestrado, o grande marco da pesquisa na minha trajetória veio a partir da parceria entre o IFMG e a UFES, por meio do DINTER em Educação. Esse programa me colocou em contato direto com o campo da Avaliação Educacional e ampliou minha visão sobre como os conhecimentos estatísticos que eu já dominava eram absolutamente essenciais para compreender fenômenos educacionais complexos.
Minha inserção no Instituto de Pesquisa em Educação e Educação Física (PROTEORIA/UFES), liderado pelo professor Dr. Wagner dos Santos, que foi meu orientador no doutorado e pelo qual tenho profunda gratidão, foi determinante. Ali pude vivenciar uma cultura de pesquisa sólida, crítica e internacionalizada. Foi quando entendi, de forma muito concreta, que pesquisa não é apenas método, é compromisso com a realidade educacional e com a transformação social.
Poderia citar alguns dos projetos de pesquisa, concluídos ou em andamento, que desenvolve no IFMG – Campus Ouro Preto?
Atualmente, desenvolvo projetos em duas frentes principais: Educação Estatística e Avaliação Educacional, que também estruturam as linhas de pesquisa do GrAMDE, grupo que lidero.
Hoje oriento sete bolsistas de iniciação científica em cinco projetos financiados por editais internos e externos:
• Qualidade Psicométrica das Questões de Matemática do Enem: Um Estudo Comparativo entre Áreas (Edital 373/2024 – IFMG/FAPEMIG/CNPq)
• Inovação na Educação Básica: O NEPSO como ferramenta pedagógica para o ensino e aprendizagem de Estatística (Edital 373/2024 – IFMG/FAPEMIG/CNPq)
• Educação Estatística no Contexto Social: Entre Números e Realidades (Edital 186/2025 – IFMG)
• Atitudes, Práticas e Autoeficácia em Matemática: Evidências do questionário do PISA 2022 (Edital 485/2025 – IFMG)
• EducAção Digital com o NEPSO: Enfrentando a violência nos ambientes virtuais, financiado pela FAPEMIG com mais de R$ 230 mil (Edital 14/2023):
Nos últimos anos, publiquei mais de 40 artigos, sendo 28 deles Qualis A e 15 Qualis A1, além de livros, capítulos e dezenas de trabalhos em anais nacionais e internacionais.
Também fui finalista do Prêmio Rubens Murillo Marques (2025) e indicado ao Prêmio Capes de Tese como a melhor tese da UFES em Educação (2023).
Minha produção completa está disponível em meu currículo Lattes.
Há algum projeto ou resultado de pesquisa do qual se orgulhe especialmente?
Sim. Tenho um carinho especial pelos projetos de Educação Estatística realizados com o NEPSO, porque eles conseguem articular, de forma muito concreta, ciência e vida real. Em um cenário de desinformação, pós-verdade e circulação massiva de fake news, formar estudantes capazes de interpretar dados, produzir evidências e compreender desigualdades sociais é urgente. E o NEPSO, por meio da pesquisa de opinião, torna isso possível de um jeito profundamente formativo.
Um dos resultados de maior destaque foi a experiência Educação estatística no contexto social, desenvolvida com licenciandos em Geografia do IFMG, finalista do Prêmio Rubens Murillo Marques. Neste trabalho, os estudantes investigaram problemas reais da cidade, conectando Estatística, território, saneamento, desigualdades socioespaciais e justiça ambiental. O mais bonito é que eles não apenas analisaram dados, mas aprenderam a olhar para o mundo de forma crítica, responsável e situada.
Outra iniciativa que me orgulha muito é o projeto desenvolvido com a Escola Estadual Padre Afonso de Lemos, em Cachoeira do Campo, financiado pela FAPEMIG. Ali, a pesquisa ultrapassa de fato os muros do IFMG e retorna para a comunidade como diálogo, ação e transformação social.
Esses projetos me tocam porque mostram que a pesquisa educacional ganha sentido quando nasce da realidade e volta para ela. O NEPSO nos coloca frente a frente com problemas concretos, nos obriga a escutar as pessoas, a levar os dados para a sala de aula, a discutir cidadania, democracia e desigualdades. E isso me lembra diariamente que a educação só é transformadora quando atravessa fronteiras e quando a escola deixa de ser um espaço isolado para se tornar parte viva do território.
Que parcerias ou colaborações têm sido importantes no seu trabalho?
O GrAMDE, liderado por mim e pela profa. Talita Emidio Andrade Soares, é um espaço central de colaboração, reunindo pesquisadores de vários campi do IFMG e de instituições como IFSULDEMINAS, IFTO, UFSJ e UFMG. O PROTEORIA/UFES, liderado pelo Prof. Dr. Wagner dos Santos, também é um parceiro estratégico, pela solidez de sua produção em Avaliação Educacional e pelo diálogo permanente em métodos e políticas. São dois grupos de pesquisa essenciais para meu trabalho.
Destaco, ainda, o Programa NEPSO (Nossa Escola Pesquisa Sua Opinião), cujo Polo Mineiro é liderado pela Prof.ª Maria da Conceição Ferreira Reis Fonseca (UFMG), articulando pesquisadores de diversas instituições e fortalecendo uma rede de ensino-pesquisa-extensão orientada por princípios freireanos de diálogo, participação e leitura crítica da realidade.
Quais são, na sua opinião, os maiores desafios enfrentados pelos pesquisadores brasileiros?
Acredito que o maior desafio é a falta de apoio estrutural ao trabalho científico. E não me refiro apenas ao financiamento, que já é muito limitado, mas às condições concretas para que a pesquisa aconteça.
Falta infraestrutura básica para lidar com bases extensas e análises complexas, faltam equipamentos adequados, softwares, servidores, laboratórios atualizados. Falta também tempo. Nos Institutos Federais, a carga de trabalho docente é muito alta e acumulamos uma quantidade enorme de demandas administrativas, comissões, orientações e atividades de ensino. É um contexto que deixa pouco espaço para o pesquisador respirar, estudar, escrever e produzir ciência com a profundidade necessária.
Outro ponto crítico é a instabilidade das políticas científicas no país. A pesquisa oscila conforme o cenário político e econômico, e isso impacta diretamente a continuidade de projetos, grupos e formações. Pesquisar nos IFs, muitas vezes, exige persistência, organização e uma resiliência que vai além da técnica: é quase um ato de resistência intelectual e social.
Ainda assim, seguimos, porque acreditamos que a ciência é instrumento de compreensão e transformação do mundo. E é isso que nos move.
Que conselho você daria para estudantes que desejam seguir carreira acadêmica e de pesquisa?
Gosto de lembrar uma frase de Paulo Freire, Patrono da Educação Brasileira, que me acompanha desde sempre: “Educação não transforma o mundo. Educação muda as pessoas. Pessoas transformam o mundo.”
Para mim, pesquisar é exatamente isso: um movimento de transformação que começa dentro da gente. Pesquisador não é quem sabe tudo. É quem pergunta com honestidade, estuda com profundidade e trabalha com rigor, mesmo quando as respostas são complexas ou incertas.
E há algo muito bonito nesse caminho: a pesquisa me levou para muitos lugares, me permitiu conhecer o mundo, suas pessoas, suas desigualdades, suas potências. Cada projeto me ensinou a enxergar a educação sob perspectivas diversas e a compreender a realidade em camadas que eu jamais imaginaria antes.
Por isso, meu conselho é simples: deixe que a pesquisa faça sentido primeiro para você. Quando ela dialoga com a sua história, com o seu território e com o que você acredita, o caminho se torna mais leve, mais bonito e, sobretudo, mais transformador.
