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Eu faço parte desta história: entrevista com o professor Rodrigo Meniconi
O arquiteto e urbanista Rodrigo Otávio De Marco Meniconi iniciou suas atividades como professor no Campus Ouro Preto em agosto de 2008, trazendo uma bagagem sólida tanto na docência, quanto na preservação do patrimônio. Natural de Belo Horizonte, foi professor na capital mineira e também no Rio de Janeiro, desde 1987. Mudou-se para Ouro Preto ainda nos anos 1990 para atuar no Iphan, onde chegou a ocupar a função de diretor. Posteriormente, ingressou como professor da graduação em Tecnologia em Conservação e Restauro, participando diretamente da consolidação do curso, inclusive lecionando para a primeira turma, iniciada em 2006.
Especialista em Restauração pela Università di Roma e mestre em Arquitetura pela UFMG, durante sua passagem pelo campus o docente coordenou o curso de graduação e também a especialização em Gestão e Conservação do Patrimônio Cultural.
Rodrigo aposentou-se em abril de 2025, após quase 17 anos de dedicação à instituição. Ao longo dessa trajetória, deixou uma contribuição marcante para a formação de profissionais na área de conservação e restauro, construindo uma história que permanece viva no cotidiano do curso e na memória de quem compartilhou com ele essa caminhada.
Confira agora mais esta entrevista da série "Eu faço parte desta história" e boa leitura!
Como foi seu primeiro dia no campus? O que mais te marcou quando você entrou pela primeira vez na instituição?
Rodrigo: No começo, o curso ainda não tinha uma sede própria, né? Então, estávamos instalados junto com o pessoal de Edificações. Eu tinha que dar umas aulas de desenho arquitetônico, e o primeiro dia foi um pouco de estranhamento. Mas, depois, foi engrenando. Posteriormente conseguimos uma sede própria, e eu fui me ambientando.
Tem algum projeto, aula ou momento que você considera o mais marcante da sua trajetória aqui?
Rodrigo: Ah, tem vários momentos. É uma coisa que nos deixa muito felizes. As turmas são relativamente pequenas, então criamos um vínculo muito grande com os alunos e com os outros professores. É um ambiente muito bom. Muito bom mesmo. Disso eu vou sentir muita saudade.
Os alunos até fizeram uma festa surpresa para mim, devido à minha aposentadoria, mas acabou não sendo tão surpresa assim. Era para ser surpresa, mas comecei a receber um monte de recado: "Ah, infelizmente não vou poder ir à sua festa" (risos).
As turmas são muito variadas... tem gente mais velha, tem quem já fez Arquitetura ou outro curso, e tem os meninos daqui, muitos vindos de distritos. Hoje em dia está mais difícil, mas sempre fazíamos viagens de estudo com eles. Fui praticamente em todas. Quando íamos, por exemplo, para o Rio de Janeiro, em cada turma sempre tinha uns três ou quatro que nunca tinham visto o mar. Que nunca tinham saído de Ouro Preto. Então, ver a emoção deles, ver como cresciam ao longo do curso, era recompensador. Hoje me encontro com eles já com vida profissional estabelecida, casados, com filhos... é muito gratificante. Isso aquece a alma.
No curso de pós-graduação, é outro nível, mas as turmas se misturam. E são ricas as trocas entre eles. Hoje temos ex-alunos que viraram professores. Foram nossos alunos e agora estão pegando o bastão e levando adiante. Isso é muito importante. Cria-se um vínculo muito, muito forte com a instituição e com a própria história deles.
Como é ver o impacto do seu trabalho na vida dos alunos ao longo dos anos?
Rodrigo: É muito gratificante. Muitos viraram professores, outros estão com a vida profissional bem encaminhada. E mesmo aqueles que não seguiram na área, viraram outras pessoas. Outro dia mesmo, tivemos uma banca de um aluno que havia abandonado o curso e depois voltou para concluir. Vimos como ele cresceu. Ele era um menino. Agora defendeu o TCC, e se saiu muito bem. São várias histórias como essas que vamos colecionando.
O que você acha que mudou mais ao longo dos anos na instituição, e como foi participar dessas transformações?
Rodrigo: No nosso curso, começamos de uma forma bastante precária, com muita dificuldade para ter um lugar próprio, salas, estrutura. Hoje temos um prédio, laboratórios montados. Inclusive, o atual coordenador do curso, Régis Martins, foi nosso aluno. Ele veio com gás, cheio de ideias e com muita iniciativa. Temos vários trabalhos de extensão, um trabalho de inserção real na história de vida das comunidades. De lá para cá, o avanço foi fantástico. Mesmo com cortes orçamentários, o curso está indo muito bem.
Agora, teremos uma mudança de currículo. A ideia é que o curso, que é tecnólogo, se transforme em um bacharelado. Isso porque há uma questão de reconhecimento da profissão. Queremos direcionar mais, pois o curso ficava entre o restaurador de bens móveis (aquele que trata de imagem, pintura, policromia) e os arquitetos. A proposta é uma graduação mais ampliada, de quatro anos em vez de três. Acreditamos que isso vai dar mais inserção no mercado e deixar mais claro qual é o profissional que queremos formar.
Durante muito tempo lutamos para que nossos egressos obtivessem o CREA ou, em um segundo momento, o CAU. Isso é uma luta. Com esse novo perfil e com o reconhecimento da profissão de restaurador, que está em tramitação no Congresso, eles já entrarão no mercado com esse respaldo, sem depender dessas brechas da Arquitetura. Temos alunos arquitetos que nos procuram para se habilitar, e temos egressos que depois fizeram Arquitetura. Nosso curso era o único de Tecnologia em Conservação e Restauro de Bens Imóveis do Brasil. Agora teremos interlocução com universidades como a do Pará, que oferece um bacharelado que abrange bens imóveis e móveis. Isso vai facilitar muito.
Em uma igreja, por exemplo. Quem restaura imagens é o restaurador de bens móveis. Quem restaura a igreja como um todo é o arquiteto. E quem restaura o altar? Aí entra o restaurador de bens integrados — esse seria o viés que se pretende, formar profissionais para atuar nesse limbo, preenchendo essas lacunas.
Quais desafios você acredita que a instituição enfrenta e ainda vai enfrentar nos próximos anos?
Rodrigo: Acho que é preciso trabalhar mais junto à comunidade, se inserir mais, ampliar a atuação com extensão. Isso é fundamental, principalmente em uma cidade como Ouro Preto. Buscar essa interação com a comunidade, estabelecer convênios para obter recursos para projetos. Acho que precisamos caminhar nesse sentido e buscar uma certa autonomia, tentar ficar um pouco mais independentes dos recursos federais, que oscilam muito. Trabalhar com extensão é um desafio, mas é um caminho promissor.
Quais são os valores ou lições que o IFMG te ensinou e que você leva para a vida?
Rodrigo: O companheirismo. Em outras instituições em que trabalhei, havia muita competição, muita disputa, mesquinharia às vezes. Aqui, não. Sempre fui muito bem acolhido, não só pelos colegas, mas por todo mundo: funcionários, direções… Então, seria o valor da camaradagem, do respeito, do desejo de construir junto. Isso é muito marcante na instituição. Pelo menos na minha experiência, sempre foi assim. Tenho boas recordações disso.
Que conselhos você daria para os novos servidores que estão começando agora?
Rodrigo: Para os alunos, eu diria: agarrem as oportunidades que são dadas. É raro ter uma formação em um campus, com essa estrutura, com professores dedicados. Então, tem que saber aproveitar e fazer por onde.
Recebemos muitos depoimentos de alunos, principalmente dos que vieram de fora, como São Paulo, por exemplo, e todos dizem isso: que a experiência de fazer o curso em um ambiente acolhedor e respeitoso foi muito gratificante. Manter isso é o mais importante, tanto para os alunos quanto para os professores que estão chegando. Não podemos deixar que isso acabe.
Se você pudesse voltar no tempo e dar um conselho para o Rodrigo que ingressou na instituição, qual seria?
Rodrigo: Eu diria para contribuir — e acho que foi isso mesmo que eu fiz. Contribuí com o que tinha de bagagem, transmitindo aos alunos e colegas. Hoje sou um dinossauro, né? Mas não me sinto distante dos colegas mais novos. Eu poderia ser pai, até mesmo avô de alguns (risos). Mas ser professor é muito engraçado, porque não sentimos que estamos envelhecendo. Os alunos estão sempre chegando, novinhos, então estamos sempre recomeçando com uma nova turma e nos espelhando nessa meninada - e achamos que não está envelhecendo. Tive um professor de Filosofia, que já faleceu, que dizia isso: que ele vivia dos alunos. Da energia deles. É isso.
